A emigração de milhares de tiroleses italianos ao Brasil Meridional, durante o período de 1874 a 1914, não foi somente o resultado de uma arrasadora crise econômica e social. Tal fluxo emigratório foi condicionado por razões ideais que se desenvolveram em ambas as partes do Oceano. No Trentino (e, em geral, nos territórios italianos dos Alpes) uma parte da Igreja Católica, especialmente vigários e padres das paróquias do interior, sonhou e projetou o deslocamento de massas camponesas às florestas brasileiras, distante do crescente sistema de produção capitalista que trazia consigo os germes degradantes da tradicional cultura camponesa.
No Brasil, uma parte da classe dos dirigentes e dos intelectuais sonhou a transformação da estrutura econômica e social do país, através da distribuição de pequenos lotes aos imigrantes europeus e a formação de uma classe de pequenos proprietários de terra, artesãos e comerciantes que teriam desenvolvido o mercado interno, desarticulado o latifúndio e emarginado o sistema escravagista de produção que privilegiava as exportações. Esses idealistas brasileiros - os liberais - com o passar do tempo souberam criar uma boa legislação para atrair e regularizar os fluxos imigratórios europeus, sobretudo entre os anos setenta e o início dos anos oitenta.
A essa altura, porém, manifestou-se no Brasil a nova hegemonia cultural e política do latifúndio paulista cafeeiro, que anulou tal legislação e, em parte, copiando-a soube atrair para si a imigração europeia. Dessa maneira, o Brasil perdeu com certeza milhares de potenciais imigrantes, não somente trentinos, que aspiravam à pequena propriedade. Depois da fase imperial, o país não soube mais (com exceção de situações geograficamente limitadas, como por exemplo, do RS), realizar um projeto complexo de colonização de áreas de fronteira dessa complexidade e tamanho. Esse fluxo emigratório, do qual o grupo trentino representou uma minoria, atingiu os objetivos pré-fixados tanto pelos idealistas católicos, que o tinham organizado e solicitado do Trentino, quanto pelos liberais.
Depois de um breve período de desorganização e dispersão, as colônias souberam realmente transformar-se em um território de relativo bem-estar econômico, organizadas com base na pequena propriedade agrícola e em comunidades baseadas sobre a família e o trabalho, que perpetuavam alguns valores trazidos pelo catolicismo, valores que na Europa estavam já entrando em crise. Isso era confirmado com vigor pelos próprios camponeses transferidos ao Brasil, em suas cartas, como também pelos sacerdotes que os tinham acompanhado e pelo pessoal consular italiano: no Sul do país os camponeses tinham reconstruido a pequena propriedade e viviam em comunidades nas quais se tinham superado a penúria de alimentos, mas nas quais, também, a hierarquia social não via mais as massas trabalhadoras submissas às vontades de nobres e burgueses.
Ano: 1999
Edição: 1ª
Editora: EST Edições
Idioma: Italiano
Páginas: 220
Papel: Ofício